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Mães cientistas: o outro lado da maternidade na academia


O dia das mães está chegando e o CCG não poderia deixar de estar presente nesta data. Primeiramente, gostaríamos de parabenizar todas as mães leitoras pelo seu dia, aproveitando também a deixa para lembrar aos filhos mais esquecidos de fazer o mesmo.

Do ponto de vista biológico, poderíamos falar sobre infinitas questões sobre a maternidade: o cuidado e investimento parental das fêmeas, o histórico genético da transmissão de mitocôndrias e como ele pode permitir um melhor entendimento da evolução de alguns grupos. Do ponto de vista da maternidade real: poderíamos falar das mais de 500 perguntas que uma criança de quatro anos é capaz de fazer em um dia, da sua nova capacidade de prever o tempo quando se torna mãe ou das tentativas de manter a sanidade mental tendo que trabalhar fora, realizar as tarefas domésticas e ser mãe.

Dentre as infinitas questões relacionadas ao tema, hoje, em especial, gostaria de abordar a seguinte relação entre a maternidade e a Ciência: Como se tornar mãe afeta a vida de muitas pesquisadoras?

Para começar, é importante lembrar que ainda vivemos em uma sociedade onde o papel da mulher é subvalorizado. Em média, as mulheres ganham 20% menos que os homens para realizar as mesmas funções, tendo que demonstrar muito mais excelência no trabalho para ter reconhecimento. Esse panorama não é diferente quando se trabalha com Ciência. A história é prova do quanto mulheres cientistas não são creditadas na mídia e no meio científico. O trabalho de um cientista é avaliado com base na sua produtividade, ou seja, quantos artigos ele publica em revistas nacionais e internacionais, quantos cursos e palestras ele ministra, quantos eventos ele organiza, entre outros critérios. Tudo isso depende diretamente da disponibilidade do pesquisador de ir a campo, de obter, analisar, interpretar dados e de ter seu trabalho creditado.

Desde que me conheço por gente, sempre quis ser bióloga. Não me esqueço da empolgação que sentia quando comecei minha iniciação científica. Pensava: “Uau, vou ser cientista, como sempre quis”! E sim, me tornei cientista e hoje sou docente titular em uma Universidade Estadual. Mas o que nunca vou esquecer mesmo, foi uma frase que ouvi de um dos maiores pesquisadores do Departamento, quando um casal de colegas foi aprovado em um concurso público: “É, agora você vai ver. Fulana, que tem até mais potencial que o marido, vai ter filhos e acabar com sua carreira. Você que não faça o mesmo”. Sim, hoje sou mãe e sei o quanto a maternidade afetou minha carreira. E não, não precisamos escolher entre uma ou outra para sermos realizadas. Você pode me perguntar, e a Fulana? Fulana está muito bem, obrigada! Depois de uma breve queda na sua produção acadêmica, ela retomou sua carreira com maestria.

Embora a maternidade afete a produtividade de uma cientista, ela não determina seu fim, e sim uma redução temporária. Enquanto os filhos forem pequenos, a mãe tem sua própria CAPES (fundação que atua na expansão da pós-graduação) interna, somada à CAPES da sociedade, cobrando perfeição, produção e excelência. Somado a isso, a maioria dos pais, quando presentes (já que o Brasil tem um alto índice de abandono parental por parte do genitor masculino), não se envolve diretamente na educação e cuidado com as crianças, muito menos, divide as tarefas domésticas. Isso tudo contribui para o esgotamento físico e psicológico destas mulheres, que já são tão cobradas para se manter em um padrão alto de publicação (exigidos dos pesquisadores nacionais pela CAPES real). Conforme os filhos tornam-se mais independentes, a rotina de trabalho destas mulheres vai retomando à normalidade.

A visão de que a maternidade afeta o rendimento/produtividade de uma mulher não é só enraizada no machismo da nossa sociedade, ela se torna real por causa dele. E não são apenas homens que pensam assim, muitas “piadas” que ouvi por ter engravidado uma segunda vez vieram, para minha surpresa, de outras mulheres (inclusive mães). Muitas pesquisadoras com quem tive contato não aceitam mulheres que tem filhos como orientandas, apesar de não perguntarem aos candidatos homens se esses são pais.

Entretanto, nem tudo é negativo no tema Maternidade vs Ciência. Experimente digitar no Google estas duas palavras e você encontrará inúmeros textos, blogs e páginas voltadas a cientistas que se tornaram mães. Embora ainda machista, nossa sociedade vem abrindo espaço, aos poucos, para as necessidades das mulheres com filhos. Muitas Universidades já contam com serviço de creche, atendendo as demandas de alunos, funcionários e docentes. Muitos eventos científicos agora disponibilizam aos seus inscritos o famoso (e muito amado por nós mães) espaço kids, e até serviços de creche. Uma grande vitória, também recente, foi o fato de que os Órgãos que financiam bolsas de pesquisa para alunos de pós-graduação passaram a incorporar a licença maternidade em seus contratos, garantindo um aumento no prazo de conclusão do curso e bolsa durante este período. Essas atitudes permitem que as mulheres possam dedicar mais tempo ao seu trabalho, tentando manter seus níveis de produção, sem renunciar ao cuidado com os filhos.

Essa é só uma parcela do que pode acontecer nos bastidores da carreira de uma mãe cientista. Também é a realidade de muitas outras mulheres, nas mais diversas profissões. E é por isso que nós, do CCG, homenageamos todas as mães pelo seu dia. E como dizer isso de um jeito bem biólogo de ser: Feliz dia do obrigado pelas mitocôndrias.

 


Texto por Dra. Caroline Garcia, mãe de João Pedro (6 anos) e Miguel (4 anos) — publicado em maio de 2020


Imagem 1: Vicky Leta / Mashable (Fonte: Medium)
Imagem 2: Robert Neubecker (Fonte: Science)
Imagem 3: “Parenting is a Full-Time Job” por Darin Lammers

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