Moramos em um país tropical e megadiverso. O Brasil representa uma explosão de biodiversidade da fauna e flora, componentes de ecossistemas de importância mundial, reguladores de clima, fornecedores de água potável, terras férteis e paisagens inesquecíveis. A constituição brasileira de 1988 diz que: Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
Para proteger as áreas naturais de forma eficiente e manter recursos a longo prazo, o governo brasileiro instituiu o Sistema Nacional de Conservação da Natureza (SNUC), Lei nº 9.985. As áreas protegidas representam espaços com características únicas e especiais, primordiais para a manutenção econômica, social, do equilíbrio natural e da nossa sobrevivência. Envolvem áreas como as Unidades de Conservação (UC), mosaicos e corredores ecológicos.
Você sabia que cerca de 18,66 % do território continental 26,46 % do território marinho brasileiro é protegido por lei? Existem 2.446 UC (entre proteção integral e uso sustentável) no Brasil. O país assinou um acordo internacional, na Convenção da Diversidade Biológica (COP-14), onde se comprometeu com algumas metas, dentre elas a meta 11 de Aichi para a proteção do meio ambiente por meio de Unidades de Conservação (17% de áreas terrestres e de águas continentais e 10% de áreas marinhas e costeiras terrestres até 2020).
O Brasil declarou recentemente ter cumprido seu compromisso, mas estender as áreas protegidas é só uma parte da meta. É preciso dobrar a meta (risos), ou seja, ainda é preciso cuidar da representatividade dos biomas (do total de UCs, 47,2% correspondem a Amazônia), conectar as áreas, manter serviços ecossistêmicos, cuidar da população do entorno e fornecer segurança e efetividade na gestão. Além disso, desde o ano passado houve um aumento preocupante nos índices de desmatamento, de invasão de terras indígenas, ausência de fiscalização/legislação ambiental, concessão irregulares de terras e perda de autonomia de instituições como a FUNAI, IBAMA e ICMBIO. Essas ações são endossadas pelo governo, autoridade responsável por proteger o patrimônio ambiental, sob justificativas questionáveis (progresso acima de todos e desrespeito a legitimidade indígena). A FUNAI estima que 85% das 561 terras indígenas brasileiras sofrem algum tipo de invasão. O registro e a demarcação das áreas não garantem o território.
Falando nisso, a FUNAI é órgão que promove e protege os direitos dos povos indígenas no Brasil, ou melhor, deveria. Sob nova direção, a FUNAI comunicou que se desfez de velhas políticas socialistas e agora atua em prol do “etnodesenvolvimento do indígena brasileiro”. Enquanto isso, inúmeras comunidades indígenas padecem diante da COVID-19, têm suas terras invadidas e suas demarcações ameaçadas pela Medida Provisória (MP) 910. Diferente da omissão da FUNAI, a mobilização social enfraqueceu o encaminhamento da votação da MP, que dá lugar a grilagem (inclusão de títulos privados) de terras públicas, pressionando ainda mais essas áreas não sancionadas e a degradação dos ecossistemas.
A MP 910 vai de encontro ao artigo 231 da constituição que garante o usufruto exclusivo dos povos que habitam as terras indígenas, e nem ao menos resolve de fato a regularização fundiária no Brasil. Entretanto já existe um outro projeto de lei (n. 2.633/2020), com as mesmas falhas e ameaças da MP 910 em discussão. O governo tem o dever de proteger nossa herança: uma natureza que oferece os mais variados recursos e permite a sobrevivência da biodiversidade como um todo. A proposição deste tipo de projeto no meio de uma pandemia, com mais de 30 mil mortos, só reafirma o desmanche intencional das nossas conquistas ambientais. Precisamos nos movimentar mais uma vez pela natureza.
Texto por Msc. Tainah Cruz Moreira — publicado em junho de 2020.
Imagem 1: Woodland Kingfisher por Daniel Gill.
Imagem 2 – Fonte: Brasil de Fato
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