• Vitória da Conquista, 19 de maio de 2024
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A ciência para o algodão: a importância de um processo de pesquisa para melhorar a produção

Por Lívia Borges

 

“Quem planta algodão, planta qualquer coisa. Mas quem planta qualquer coisa não planta algodão”

Júlio Cézar Busato, Presidente da Abrapa e produtor associado da Abapa.

 

Foto: Abapa – Associação Baiana de Produtores de Algodão

 

O Brasil é um dos maiores exportadores de algodão do mundo junto com os Estados Unidos, Índia e Paquistão. A Bahia fica em segundo lugar como maior produtora do país. Do algodão tudo é aproveitado, desde o caroço, a casca do caroço, o línter e, principalmente, sua fibra longa natural, que possui alta procura comercial. A indústria desses produtos movimenta a economia mundial, a fibra e derivados como línter estão entre um dos produtos mais importantes para diversos segmentos como o da tecnologia e indústria têxtil.

A cultura do algodão (Cotonicultura) iniciou no Oeste da Bahia na década 1990, após a perda de plantações de algodão nas regiões como Maranhão, Ceará, Pernambuco e Pará, onde tinha as maiores produções do Brasil. A presença do algodão na Bahia se destacou na região do Cerrado e deu uma nova direção para a trajetória do algodão no país, superando as perdas dessa cultura em grandes áreas do sudoeste com Minas Gerais e São Paulo.

A perda de grandes lavouras para a praga chamada Bicudo-do-algodoeiro, fez com que os produtores migrassem para outras regiões e se uniram para combater o temido inseto. Buscaram investir em recursos tecnológicos e pesquisa de ponta, para enfrentarem os desafios da produção. O resultado dessa união foi o desenvolvimento da cotonicultura e o crescimento para as cidades que fazem parte da região Oeste da Bahia. Paralelo com o crescimento do agronegócio, outros investimentos e negócios foram sendo implantados, com uma forte geração de empregos e renda, principalmente nos municípios de Luís Eduardo Magalhães e Barreiras.

A rede de comunicação feita pelas associações dos Estados produtores de algodão em parceria com a Abrapa (Associação Brasileira dos Produtores de Algodão) aprofundou os investimento em pesquisa e desenvolvimento no ciclo de produção e combate das pragas comuns ao plantio da cotonicultura. A partir dessas ações, o Brasil entrou na safra de 2003/2004, e recuperou novamente o título de um dos maiores produtores do mundo, superando o período de uma intensa importação do produto, para manter as fábricas internas, que dependiam da produção algodoeira que foi perdida anteriormente.

O plantio dessas novas mudas de algodão a partir da aplicação de novas técnicas e novos conhecimentos adquiridos com altos investimentos em pesquisas e tecnologias, qualificaram a agricultura familiar e os produtores de algodão. Essas medidas geraram o início de uma rede de compartilhamento de informações com outros produtores e a otimização dos defensivos agrícolas e do solo, foi um passo importante para os produtores terem melhores condições de desenvolvimento das lavouras de algodão.

Para plantar algodão de maneira correta e com rendimento, o processo é delicado e o investimento para o melhoramento deve ser recorrente. Os efeitos do investimento em tecnologias, duplicou a produção e diminuiu a área plantada, como era antes da praga Bicudo. O algodão tem uma área plantada seis vezes menor que a da soja, mas o seu rendimento chega a metade do valor rentável por ano, isso aponta como essa área da agricultura tem forte poder econômico para o país. Além de crescimento e expansão da produção, a tecnologia ajudou a aumentar a conservação do Meio Ambiente, chegando a 35% de áreas preservadas nas fazendas, mantendo o Cerrado de pé.

 

Plantação e Manejo

 

O planejamento de produção do algodão começa com o solo e seu manejo. Quando os primeiros produtores chegaram no solo do Oeste baiano, foi comprovado após pesquisas que era um solo pobre de nutrientes e matéria orgânica. O bioma da região formado pelo Cerrado, um solo já antigo, é bastante explorado por ações climáticas, retirando assim a cobertura de fertilidade e matérias orgânicas do solo. Segundo o Prof. Jorge da Silva, da Universidade do Estado da Bahia – UNEB, “o solo da região contém apenas 1% de matéria orgânica”.

Investimento em fertilização do solo e o início do manejo de rotação de culturas, devolve ao solo produtividade e qualidade. A rotação de culturas incentivou o plantio na grama das mudas, em terras onde se planta a soja, o milho e o capim. Esse modo de manejo, refere-se à rotação ordenada de diferentes variedades de culturas em um determinado período do ano, na mesma região e na mesma estação. Dessa forma, pragas e doenças decorrentes da alternância de espécies de plantas hospedeiras são evitadas e o solo se regenera. Com solos claros e mais férteis, o algodão sai mais branco e com fibras melhores, aumentando assim sua procura.

Junto ao uso da rotação de culturas para combater variadas pragas comuns no clima tropical, as quais se reproduzem com mais facilidade, pode-se fazer o uso de biofábricas nas fazendas. As biofábricas são estruturas de produção e laboratórios que produzem microrganismos, como mudas de plantas, bactérias ou fungos, para controle biológico de pragas, indutores de resistência e estimulantes de plantas.

A lavoura do algodão do Oeste, após o beneficiamento do solo também depende da estação de chuva para se desenvolver. Assim, a técnica usada para a plantação do algodão é o regime de sequeiro, que segundo dados da Abapa, no sequeiro é utilizado em média de 258,5 mil hectares plantados de algodão, e o irrigado é de apenas 50,5 mil hectares. As mudas vão para o solo no período de chuvas, que ocorre entre outubro e abril, podendo ser mais curta ou espaçada, ocorrendo um monitoramento regular para se ter um controle de quando é feito a plantação no solo, e quantas toneladas de algodão são colhidas no período de seca.

A colheita das flores de algodão, são feitas por colheitadeiras e são produzidas bobinas gigantes de algodão, que são transportados em caminhões com a capacidade de 14 rolos, em seguida levadas para as algodoeiras para serem beneficiadas, separando as fibras do caroço do algodão. O mês de julho é o período em que se inicia o beneficiamento do algodão. Desde a fazenda até a algodoeira, a comunicação é muito detalhada e específica sobre cada lote que se recebe, pois conta com informações da hora colhida, o hectare de colheita, se a máquina que esteve em contato quebrou por causa do risco de peças dentro dele, considerando assim o seu armazenamento e beneficiamento.

O armazenamento do algodão na algodoeira tem regras e cuidados para serem seguidos quando chegam ao pátio da fábrica, para se manter a qualidade e segurança no processo. Segundo Alessandra Zanotto, administradora da Algodoeira Zanotto Cotton, informou que “esse armazenamento, em forma de fileiras com esse espaçamento, tem toda uma lógica de segurança, para evitar risco de incêndio, e também para facilitar a mobilidade das máquinas que pega esse rolinho, levando até a máquina lá dentro. Então todo esse formato, essa forma que vocês veem os rolinhos seguem todo um planejamento e uma ordem que facilite também nosso trabalho. A gente não pode colocar de qualquer jeito”.

Pátio da Algodoeira Zanotto Cotton. Alessandra Zanotto apresenta a algodoeira. Foto: Abapa.

A região por ser muito seca, o ar retira muita umidade do algodão e o solo produz muita poeira, a alternativa para garantir que o algodão seja protegido é molhar o solo várias vezes ao dia, sendo o único momento que se utiliza água nesse beneficiamento. A chegada e saída do processo de beneficiamento é rápido, se leva primeiro a uma máquina ao qual separa o algodão da casca, que é descartada fora do espaço do galpão da fábrica, o nome dado a ela é o de piranha. Após isso se leva a máquina onde separa a fibra do caroço e línter. Essa fibra é catalogada em tipos, após ir para o centro de análise de fio, que seleciona a qualidade do fio e para qual destino será sua produção.

A qualidade do fio é catalogada por tipos e quantidade de fios, desde do de baixa qualidade para fazer calças jeans e outros materiais até os melhores, usados para exportação e tecidos de alta qualidade, o que aumenta a maciez e o luxo das roupas. Esses tipos e características da fibra são designados pelo centro de análise, que trabalha junto com a algodoeira para garantir a qualidade da fibra branca do algodão.

O Centro de Análise é considerado como o maior da América Latina, fica localizado em Luís Eduardo Magalhães, tem a capacidade para receber 18 mil amostras de algodão por dia, fazendo a análise e catalogação visual e HVI das fibras, de maneira segura e totalmente monitorada desde a temperatura do ambiente de trabalho, o cuidado com contaminação, até o momento de entrega dos resultados da análise.

Linter, o resto do algodão que sobrou envolvendo o caroço tem o destino e o uso vai para os mais variados tipos de produtos, sendo usado em indústrias tecnológicas, desde a tela do celular e baterias, até o cotonete, a roupa hospitalar, algodão de farmácia e pano de chão. O uso é variado e está presente no cotidiano da população.

Foto: Abapa.

O caroço e a casca, tem um destino diferente. A casca é utilizada para a fábrica de ração e o caroço faz óleo vegetal de consumo humano. Armazenado em galpões, o caroço começa pelo manejo de retirar o línter, passa pelo moedor onde se retira o óleo e é transformando junto com a casca em torta e farelo, alimentos para bois, ovelhas e outros animais.

A pesquisa e a ciência foram importantes para o desenvolvimento de meios que produzissem um produto com qualidade, rastreabilidade e sustentabilidade. O algodão é uma fibra importante para a economia, os seus usos são tão variados que muitas vezes as pessoas ficam surpresas ao saber onde pode ser encontrado, por isso é importante saber de onde vem, sua qualidade e história.

 

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